domingo, 11 de outubro de 2009

Conselho




Cerca de grandes muros quem te sonhas.

Depois, onde é visível o jardim

Através do portão de grade dada,

Põe quantas flores são as mais risonhas,

Para que te conheçam só assim.

Onde ninguém o vir não ponhas nada.

Faze canteiros como os que os outros têm,

Onde os olhares possam entrever

O teu jardim como lho vais mostrar.

Mas onde és teu, e nunca o vê ninguém,

Deixa as flores que vêm do chão crescer

E deixa as ervas naturais medrar.

Faze de ti um duplo ser guardado;

E que ninguém, que veja e fite, possa

Saber mais que um jardim de quem tu és

Um jardim ostensivo e reservado,

Por trás do qual a flor nativa roça

A erva tão pobre que nem tu a vês...

Fernando Pessoa

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