quinta-feira, 30 de outubro de 2008
Poema enjoadinho
Filhos . . . Filhos?
Melhor não tê-los!
Mas se não os temos
Como sabê-lo?
Se não os temos
Que de consulta
Quanto silêncio
Como os queremos!
Banho de mar
Diz que é um porrete . . .
Cônjuge voa
Transpõe o espaço
Engole água
Fica salgada
Se iodifica
Depois, que boa
Que morenaço
Que a esposa fica!
Resultado: filho.
E então começa
A aporrinhação:
Cocô está branco
Cocô está preto
Bebe amoníaco
Comeu botão.
Filhos? Filhos
Melhor não tê-los
Noites de insônia
Cãs prematuras
Prantos convulsos
Meu Deus, salvai-o!
Filhos são o demo
Melhor não tê-los . . .
Mas se não os temos
Como sabê-los?
Como saber
Que macieza
Nos seus cabelos
Que cheiro morno
Na sua carne
Que gosto doce
Na sua boca!
Chupam gilete
Bebem xampu
Ateiam fogo
No quarteirão
Porém que coisa
Que coisa louca
Que coisa linda
Que os filhos são!
(Vinícius de Moraes)
domingo, 19 de outubro de 2008
Como é por dentro outra pessoa
Quem é que o saberá sonhar?
A alma de outrem é outro universo
Com que não há comunicação possível,
Com que não há verdadeiro entendimento.
Nada sabemos da alma
Senão da nossa;
As dos outros são olhares,
São gestos, são palavras,
Com a suposição de qualquer semelhança
No fundo.
(Fernando Pessoa)
domingo, 12 de outubro de 2008
Sinfonia inacabada
Tenho que admitir que Deus me fez perfeita!
Não no sentido de só ter qualidades e não ter defeitos, mas no sentido de enxergar, ouvir, falar e andar.
Acordo todos os dias com uma sensação de felicidade e sou agradecida por ser saudável e estar viva, mas tenho que confessar que tenho um pequeno defeito de fabricação : - Um vazamento crônico!
Parece que tudo é motivo para uma torrente de lágrimas em minha vida.
Tudo é motivo para meus olhos transbordarem em lágrimas : se vou ao jardim molhar as plantas e descubro uma nova flor, se recebo um cartão junto de um vaso de flores em comemoração à entrada da primavera, se minha filha caçula vai ao shopping com o namorado e me liga perguntando que sabor de bolo eu prefiro que ela me traga.
Fico me perguntando se este vazamento é normal.
Quando estou na igreja e o coral canta a "Lacrimosa" de Mozart, é inveitável a enxurrada de lágrimas que invadem meu rosto sem pedir permissão.
Ás vezes estou arrumando uma gaveta e lá encontro um bilhetinho de uma de minhas filhas , emociono-me de uma tal maneira, que fica até impossível terminar de ler sem que meu óculos fique todo embaçado e o meu nariz fique parecendo um narizinho de palhaço.
E o engraçado é que conforme o tempo passa, o tal vazamento piora, aparece com mais frequência e intensidade.
Ultimamente, durante os ensaios da orquestra e mesmo nos concertos, tenho passado maus bocados com esse vazamento impertinente.
Fizemos recentemente um concerto na Loja Maçônica de São Paulo e fui presenteada com a presença de duas amigas e da minha filha caçula ( ela sempre comparece quando pode).
Antes de começarmos a tocar uma das peças, olhei para a platéia e meus olhos encontraram-se com os de minha filha, ela sorriu e fez um desenho em forma de coração com as mãos.
Pronto!
Foi o suficiente para que meus olhos se enchessem de lágrimas !
O espantoso é que nem tem sido com Mozart ou Beethoven,pode ser com qualquer um que toque meu coração. Nos últimos tempos tem sido com Schubert, para ser mais exata, com a sinfonia inacabada.
Não sei que analogia meu cérebro (ou coração) faz com esta sinfonia e minha primogênita.
É alguma coisa inexplicável!
Talvez por ela nunca ter ido assistir um concerto meu ou talvez por ter casado e levado ao pé da letra o versículo do Gênesis que diz "Por isso o homem deixa o seu pai e sua mãe para se unir à sua mulher..."
Não há um concerto sequer em que durante as pausas da música, meus olhos não procurem insistentemente por uns olhos de "peixinhos de aquário"!
Quase não nos vemos, pouco sei de sua nova vida, a não ser pelo seu blog.
Entro como uma espiã para saber algumas novidades do seu dia a dia, se está feliz, cansada,resfriada , animada ou triste.
Às vezes descubro pequenas coisas que gostaria que compartilhássemos , coisas bobinhas como a compra de um novo vaso de flores, ou uma não tão boba como sua viagem de férias.
O incrível é que Schubert me faz sentir uma saudade imensa da "minha caçadora de joaninhas" com olhos de peixinhos de aquário, e nem sei explicar o porquê!
Acho que na realidade, nossa vida é como uma sinfonia inacabada, ela só termina quando fechamos os olhos e partimos rumo à eternidade.
Nana Pereira
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